Aulas noturnas clandestinas numa igreja. Foi assim que Elias Miguel e seu irmão Calixto conseguiram ter uma formação básica, pois os turcos governavam a região e não permitiam que a população cristã estudasse. Essas aulas eram uma forma de resistëncia patrocinada pela Igreja Ortodoxaa Russa. Seus irmãos mais novos não tiveram sequer essa possibilidade.
No Brasil, os dois inicialmente se concentraram em seus negócios. Quando decidiram chamar as famílias e os outros irmãos novas prioridades se apresentaram, em especial a escola para os mais novos. A educação se tornou um verdadeiro culto para a família. Todos se uniam no esforço de proporcionar às crianças e jovens uma formação sólida, que os levasse a uma profissão. Pais, tios, primos, irmãos, todos buscavam esse objetivo numa época em que as facilidades oferecidas atualmente eram impensáveis.
De início recorreram aos mestres-escolas e professores particulares. Um grande apoio nessa fase foi a presença de Bourhan Helou. Tinha sólida formação humanística adquirida na universidade francesa de Beirute e nos estudos com jesuítas em Roma. No Brasil, foi autodidata em contabilidade e se tornou contador respeitado. Foi assim que recebeu o convite de Calixto e Elias Miguel para que se integrasse aos negócios e ao convívio da família. Mais tarde, em Goiânia, chegou a ministrar aulas gratuitas a jovens sem recursos, e a Câmara Municipal o tornou cidadão goianiense. A autobiografia “Memórias de um Imigrante” registra passagens de sua vida e denota sua nobreza de caráter.
Quando Elias Miguel foi residir em São Paulo, em 1920, abriu-se a possibilidade de matricular as crianças em colégios e os mais adiantados em cursos profissionalizantes; mais tarde alguns chegaram às raras faculdades da época. Foi assim que os menores frequentaram o Colégio Batista Brasileiro e os maiores os Colégios Mackenzie e das Bandeiras, Paralelamente, professores particulares ensinavam línguas, pintura, música ou ofícios profissionais às moças, que também eram estimuladas a ampliar seus conhecimentos e trabalhar.
Essa atitude, porém, não atendia ao número crescente de crianças e jovens em idade escolar na família, e as dificuldades aumentaram ainda mais com retorno dos dois irmãos a Ipameri em 1930; isso eliminou o apoio que as duas residências ofereciam em São Paulo. Nesse momento surgiu a ideia de criação de um ginásio em Ipameri, que rapidamente ganhou a adesão de inúmeras famílias que tinham o mesmo problema.
Tal proposta partiu de outro educador notável, Eduardo Mancini, que hoje dá nome ao Colégio Estadual de Ipameri. Ele sugeriu que se formasse uma cooperativa para instalar um ginásio na cidade e mostrou aos pais que isso seria mais efetivo do que enviar os filhos para outras cidades, dada a quantidade de alunos em potencial. A ousadia dessa iniciativa pode ser avaliada quando se considera que eram raros em Goiás os estabelecimentos escolares de segundo grau, geralmente mantidos por congregações religiosas, pois o Estado só comparecia com o importante Liceu de Goiás, na antiga capital Vila Boa. A destacada participação não só da família Daher, mas de toda a colônia, na implantação desse estabelecimento reflete-se no nome que tomou inicialmente: Colégio Sírio Brasileiro.
Depois da instalação desse Ginásio, Elias Miguel voltou a ser grande colaborador em todas as campanhas de arrecadação de fundos para erigir o belo conjunto que abrigou o Ginásio e Escola Normal Nossa Senhora Aparecida, criado por orientação do Bispo de Goiás, que iniciou suas aulas quatro anos depois do ginásio de Eduardo Mancini. Tais campanhas se estenderam por mais de vinte anos e confirmaram o empenho e capacidade dos ipamerinos na criação de um sistema escolar criado e mantido pelos cidadãos.