Duas famílias,
uma casa

Antes de construir sua casa, a família de Elias convivia com a do irmão Calixto num casarão situado em frente…

Antes dessa casa, as famílias de Elias Miguel e do irmão Calixto moravam juntas. O convívio entre eles era tão intenso que os limites dos dois grupos eram imperceptíveis para os moradores da cidade; estes não sabiam identificar quem era irmão ou primo de quem. A mudança para a nova casa não modificou isso.

O espírito afável e colaborativo ia além do parentesco: Bourhan Helou, que conviveu com eles durante algum tempo, foi sempre para aqueles jovens o “tio Bourhan”.

À direita assinala a casa que os irmãos compraram assim que vieram para Ipameri; após a estada em São Paulo voltaram para ela. Rafa e Cesar também residiram aí quando se casaram, num anexo assobradado que fora construído pouco antes. Em 1944 se mudaram para a casa de Elias, indicada à esquerda.

Na nova casa de Elias Miguel, essa cordialidade se manifestou no acolhimento ao noivo escolhido pela filha Rafa. Cesar Augusto Ceva era um ipamerino alheio à intimidade da família, mas foi tão completamente assimilado que - já com dois filhos - todos passaram a viver juntos após a morte de Helena, a mulher de Elias.

O genro, ele próprio, demonstrou idêntica capacidade de adaptação, indo ao extremo de aprender a língua árabe. Sua presença tem muito a ver com o tema da escolaridade, pois conheceu Rafa quando ministrava aulas no curso de madureza do Ginásio Sírio Brasileiro. Mais tarde, ela também se tornou professora, e ele inspetor federal de ensino; já neste cargo cursou engenharia, convertendo-se assim num exemplo consumado de entusiasmo pelas duas faces da educação: ensino e aprendizado.

Ao longo dos anos, a reduzida célula familiar de Elias Miguel consolidou a passagem da condição de imigrantes para a de cidadãos ipamerinos: os fundadores eram libaneses mas os que aí cresceram já eram brasileiros. Ao longo do tempo, foi como se a própria casa fosse mudando de identidade, e isso pode ser demarcado em 1955, quando Elias Miguel e a filha Jamile, que conservavam a nacionalidade libanesa, se naturalizaram. E se consolidou em 1958, quando obtiveram seus títulos de eleitores, marca da cidadania completa.

O título de eleitor brasileiro, marco definito da rota de Elias Miguel pelo mapa das nacionalidades. Ele nasceu como sírio em 1880, emigrou como turco em 1904, tornou-se libanês em 1937 e brasileiro em 1955.

Os valores da cultura árabe continuaram sendo sempre praticados em convívio com os costumes brasileiros. Esse peculiar caráter conciliador frente à diversidade e respeitador da tradição permaneceu estampado definitivamente na casa.

Cronologia dos pioneiros

A família Daher que se fixou em Goiás veio da aldeia Cheikh Taba, no Líbano, fundada por volta de 1680 pelo xeique Youssef (José) Daher. Ele gerou Miguel, que gerou um segundo José, que gerou um segundo Miguel. Dois filhos deste vieram para o Brasil em 1904. Em 1988 faleceu Ramza Jacob Daher, a última integrante desse grupo de pioneiros.